Três atos de uma vida: tortura, sequestro e morte no forno

Meu amigo de infância, companheiro de brincadeiras, conversas, jogos de futebol e correrias nos tempos da Vila Operária, em Criciúma, terminou sua vida de militante político jogado no forno de uma usina de açúcar do norte de Campos por um dos homens da ditadura militar. Virou cinza, como todos os outros. É o primeiro da lista de 10 nomes revelada pelo ex-delegado do Dops Cláudio Antônio Guerra no livro Memórias de uma Guerra Suja, lançado esta semana. Só me dei conta disso ao revisar a lista, alertado por um amigo – e lá estava o nome de João Batista Rita. Foi um impacto devastador. Nascemos no mesmo ano, crescemos juntos, brincamos e nos separamos, como os jovens de Criciúma faziam naqueles anos 60, quando chegava a hora de cursar o secundário (hoje Ensino Médio). Cada um tomou o rumo de uma cidade distante de seu ambiente. Fui para Tubarão, depois Florianópolis. João Batista escolheu Porto Alegre.

A Rua Bagé, na época uma via de chão batido, com canaletas provocadas pela água da chuva em cada lateral, ligava os antigos trilhos do trem à Henrique Lage. Cortava a Vila Operária, com suas casinhas de madeira de quatro peças, mais uma pequena área de alvenaria, todas construídas para aluguel (morei em uma delas, a mesma em que minha mãe, dona Antonina, escondeu o irmão Antoninho, líder dos mineiros da cidade, que era procurado pela polícia nos primeiros dias do golpe), começava em uma parte mais baixa, subia e chegava à rua principal. Quando ela terminava, do outro lado, para quem subia, havia um imenso terreno, cercado por muros, onde ficava a mansão de um dos médicos mais importantes da cidade. Em um dos cantos desta área, em um chalé de madeira, morava o caseiro e seu filho – meu amigo João Batista.

Ele e o filho do patrão, da mesma idade, cresceram e estudaram juntos. Éramos parte da mesma turma.

Não chegávamos a fazer planos, nem falávamos em sonhos naqueles tempos, a não ser nas fantasias infantis, mas tenho certeza de que João Batista (foto), enquanto crescia, passou a perceber as diferenças entre o filho do caseiro e o do patrão.

As bases da militância que mudaria sua vida para sempre foram firmadas aí.

Depois que nos separamos, perdi contato com quase todos, mas especialmente com João Batista por razões que só entenderia mais tarde. Mas, por uma destas estranhas casualidades da vida, passei a tomar conhecimento do que ele fazia em pequenos atos, de tempos em tempos – daquele início em Criciúma ao fim decretado pelo forno da usina carioca revelado no livro. Foram exatamente três atos. Em cada um deles, a informação chegava a mim, como se fosse um recado, em pequenas brechas abertas, ou por descuidos dos censores, ou por iniciativa de homens ligados à ditadura.

O primeiro deles: no início dos anos 70, abri uma das edições da Realidade, que colecionava, e passei a ler um texto sobre a perseguição a presos políticos. O repórter conseguiu informações e penetrou nos labirintos da Base Aérea do Rio, um dos endereços da tortura. No meio do texto, ele descreveu uma picape que saía da base, com a carroceria lotada de corpos de militantes torturados, muitos deles feridos gravemente, outros já mortos. Entre as vítimas de tortura, ainda vivas, estava João Batista Rita, meu amigo, que na época tinha pouco mais de 22 anos.

O segundo ato: décadas depois, exatamente em novembro de 2006, recebi um surpreendente telefonema de alguém que se identificou como militar da reserva e ex-assessor de Médici. Ele tinha acabado de ler meu texto sobre o filme O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, na coluna Bola Dividida (é um excelente filme brasileiro sobre o período em que as pessoas simplesmente ‘desapareciam’). O oficial tinha alguns reparos – e passou a defender o regime, transformou o ditador Médici em democrata e, por fim, me desafiou a dizer se algum dos meus conhecidos tinha desaparecido nos porões. Citei João Batista Rita. Ele me pediu algum tempo e, meia hora depois, em um fim de tarde de domingo, enviou um e-mail para a Redação com o resumo da vida de João Batista em umas 20 linhas. Recuperado da surpresa de ver que a comunidade de informação (ou parte dela) continuava ativa em plena democracia, a ponto de alguém levantar rapidamente a ficha de um militante em um domingo, li que meu amigo tinha se exilado na Argentina. As informações paravam aí, claro (sem referências à sessão de tortura na Base Aérea), até porque, sabe-se agora pelo delegado, ele já tinha sido torturado e jogado no forno.

O terceiro ato: na tarde da última quarta-feira, conferi um texto compartilhado no Facebook e conheci em detalhes a macabra narrativa do ex-delegado do Dops, um torturador arrependido e hoje convertido em pastor. Em depoimento aos jornalistas Marcelo Netto e Rogério Medeiros para o livro Memórias de uma Guerra Suja, ele revelou nomes de chefes militares, policiais, políticos, empresários dos tempos da ditadura. Deu cara aos torturadores, muitos deles escondidos atrás de uma conveniente cortina chamada Lei da Anistia.

Um dos episódios narrados em detalhes pelo torturador, um dos tantos daquela época que teria lugar de destaque entre os nazistas, estava a escolha do forno de uma usina do norte do Rio. Aprovado pelos chefões graduados, depois de uma rápida vistoria, o local foi utilizado para incinerar militantes presos, torturados, mortos, sequestrados. Ele deu a lista dos 10 nomes jogados no forno – e lá estava o de João Batista Rita, que foi sequestrado em Buenos Aires pelo delegado Fleury em 1973, certamente em uma das tantas ações conjuntas da famigerada Operação Condor (aquela que previa troca de opositores entre as ditaduras do continente).

A revelação complementa, como você pode ver, a informação passada por e-mail por aquele ex-assessor de Médici no domingo de 2006, que parou no relato de que João Batista fora para a Argentina. Cláudio Guerra revelou o que ocorreu a partir daí, passando pelo sequestro em Buenos Aires e o assassinato na usina do Rio.

Com este último ato, meu amigo virou lembrança, definitivamente. Vou recordar para sempre – com o carinho que se costuma devotar aos amigos que nos orgulham – daqueles tempos inocentes da Vila Operária, em Criciúma, mas, principalmente, de um companheiro que teve coragem de enfrentar a ditadura e de lutar pelo que julgava certo, sem abrir mão de seus ideais. Por eles foi torturado, sequestrado e assassinado.

Sobre mariomarcos

Jornalista, natural de criciúma, fã incondicional de filmes, bons livros e esportes
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56 respostas para Três atos de uma vida: tortura, sequestro e morte no forno

  1. tiagonobre disse:

    Bá, que soco no estômago…

  2. Vítor disse:

    Achei um link interessante sobre a história do Rita. Lembrei deste nome, pois estive fazendo um trabalho para a faculdade e lembro de ter lido algo sobre ele.
    http://www.torturanuncamais-rj.org.br/MDDetalhes.asp?CodMortosDesaparecidos=266

  3. Jonas Rafael disse:

    *silêncio*

  4. Não pude clicar em “Gosto”. Grande texto, imensa dor!

  5. edi tavares disse:

    Mário Marcos, parabéns pelo texto irretocável, como de praxe. amigos para mim são a família que escolhemos, creo que não deve ter sido fácil, ver seu amigo na ista do forno, por mais que soubesse que já estava morto.
    Como sempre que você escreve sobre o período militar, vão aparecer os defensores do regime, acusando guerrilheiros de serem assassinos e etc… mas feliz deles, que podem ter LIBERDADE DE EXPRESSÃO, sem que sejam perseguidos, torturados, ou simplesmente incinerados em um forno.

    • mariomarcos disse:

      Este é o ponto central, Edi: hoje, muitos que defenderam aquele regime, têm absoluta liberdade para defendê-lo. É bem diferente do que ocorria com quem pensava diferente naquela época.

      • ZAMORA disse:

        Lamento muito Mario.
        Imagino o que voce esta passando .
        Naquela epoca eu ” servia ” na PE ( como já me referi em posts anteriores ) e presenciei torturas que nos obrigavam a assistir para não as denunciar, pois diziam, seriamos cumplices ( tinhamos 18, 19 anos na época e nos borravamos de medo ).
        Tem programa de radio, hoje , de manhã cedo , que não acredita nestas coisas. Sem serem torutrados…
        Lamento e minha maior solidariedae . Dá vontade de chorar .

  6. Zeca Nivete disse:

    Imagino como você está se sentindo.

  7. Ramires disse:

    Mario, obrigado por compartilhar, eu quando menino vi pessoas serem jogadas em camburões sem identificação simplesmente por terem participado de uma reunião sindical ou alguma denuncia vazia. Sendo estudante e filho de trabalhador cresci com medo da polícia e asco dos símbolos nacionais associados aqueles que dele tinham tomado posse. Textos com este que materializam o “exagero da esquerda” ajudam a esclarecer a verdade de o que realmente acontecia aqui enquanto as pessoas assistiam Fantástico e liam a Veja. Obrigado novamente.

  8. P*ta m*rda MM! Meus sinceros sentimentos.

  9. edi tavares disse:

    MM, peço licença para postar um vídeo, da presidenta Dilma, ainda ministra, falando da ditadura ao responder um questionamento da oposição.

    • ZAMORA disse:

      Bravo Edi. Bravo Dilma .

    • gilspector disse:

      Parabéns Edi!
      Esse Agripino Maia (RN) realmente estava em lado oposto ao da então militante Dilma. Bela contribuição.

    • João Carlos disse:

      Ditadura. Como bem disse Dilma, é uma chaga na raça humana, seja de direita como no Brasil, Chile ou Argentina, seja de esquerda como na União Soviética ou China. Não existe ditadura light, ditadura boazinha, todas elas em maior ou menor grau são um atentado a vida humana, toda ditadura é miserável. Esta é a verdade que tivemos de conhecer da pior forma possível. Todo ser humano de bem precisa ter vigilância permanente para jamais permitirmos que nossa sociedade seja maculada novamente por tragédias como esta relatada no post ou descrita pela Dilma. É disto que estamos falando aqui, de tragédias humanas, de vidas e famílias despedaçadas pelo simples fato de se oporem ao regime dominante, por tentarem contestar os donos do poder. Fiquemos atentos, vigilantes e não nos enganemos, mesmo pequenas ditaduras no caribe ou grandes ditaduras na África ou Ásia são igualmente detestáveis e devem ser combatidas firmemente pela comunidade internacional como exemplos de atentados a dignidade humana. Ao conhecer a dor daqueles que perderam alguém na nossa ditadura, sabemos o que aqueles que não tem voz ou mídia nas ditaduras pelo mundo estão passando neste exato momento ao tentarem contrariar o regime, e isso é inadmissível.

  10. Marcus disse:

    Caro Mario,
    o pessoal da nossa geração tem muitas histórias para contar sobre isso. Amigos que sumiram e voltaram anos depois, amigos que desapareceram sem deixar vestígios…
    E é sempre bom saber para onde eles foram, mesmo que seja para ter certeza da sua morte.
    Estas histórias são chocantes, a nova geração praticamente não acessa o que está sendo dito, mas isso precisa ser expurgado, de alguma maneira…
    Confesso que chorei lendo o seu texto, talvez por me lembrar de alguns fatos.
    Parabéns e obrigado por lembrar disso…
    abs
    Marcus

    • ZAMORA disse:

      Marcus .
      Como disse anteriormente , eu vivi e servi na PE naquela epoca .
      Fazia prisões e batidas ” para prender subversivos ( dá pra rir , né ?)
      Tinha apenas 18 anos e achava a ” Redentora ” a maior maravilha domundo .Era um alienado.
      Tinha um tio ( vivo até hoje – Graças a Deus ) que era do sub mundo dos ” Subversivos ” …. rsrsrsrsrs
      Morria de medo de um dia ve-lo entrar na PE , onde eu servia , ou sendo mesmo, obrigado a prende-lo .
      Não se envergonhe de ter cjorado, pois é o que estou fazendo agora .
      Abs ,
      Zamora .

  11. NANDO DE NOVO HAMBURGO disse:

    Mário, parabêns para ti, por não deixares cair no esquecimento a luta inglória de tantos brasileiros.
    Se hoje temos um país estabilizado ou quase isso, devemos muito a estes verdadeiros heróis anonimos.
    Anonimos por que nunca virarão nome de rua, nunca terão suas histórias contadas e recontadas nas escolas públicas e nunca terão reconhecidos seus atos.
    Vida longa a ti.

  12. Marta Cioccari disse:

    Mário Marcos,
    Excelente relato, que nos toma por completo e nos comove da primeira à última linha. Obrigada também por nos ajudar a entender a trajetória da vida de militância, do sofrimento e da morte assombrosa, nas mãos da repressão, de um filho de trabalhador que cresceu contigo numa Vila Operária de Criciúma.
    Grande abraço.
    Marta Cioccari

  13. Prezado Mário Marcos,
    Queria escrever um texto contundente, algo que refletisse a indignação pela falta de respeito ao ser humano. Existe algo mais vil do que torturar alguém, fisica ou psicologicamente? Não conseguirei. Paro por aqui. Lamento pelo que sentes neste momento, lamento pelos demais que ainda não sabem do destino dos seus entes desaparecidos.
    Como consolo, se é que é possível um, tua crônica vai dar prêmio; podes crer.

  14. Paulo Roberto Tiecher de Jesus disse:

    tua dor é a dor de centenas de familiares destes grandes brasileiros que deram sua vida pra um Brasil melhor pra todos…..
    me solidarizo com vc, pois tive muitos amigos que simplesmente “sumiram” da noit epro dia e nunca mais apareceram….
    QUEREMOS PUNIÇÃO RIGOROSA E JÁ!!!
    QUEREMOS JUSTIÇA!!!!
    Saudações de Luta e Comunistas, Sempre!!!
    Paulo Roberto Tiecher de Jesus
    Porto Alegre/RS

  15. Maria Helena disse:

    E ainda temos defensores da ditadura, e contra a Comissão da Verdade !!!

  16. Santiago disse:

    Triste a história. A turma da pizza ainda vem falar que revogar a Lei de Anistia à Tortura geraria insegurança jurídica.

    Me pergunto se esse tipo de comportamento era crime no Brasil naquela época, porque, se for – e obviamente era – os monstros sanguinários teriam cometido um crime de acordo com a legislação vigente. E os torturadores e seus seguidores ainda falam em insegurança jurídica.

    Continuo com a minha opinião. O Brasil precisa promover empalamentos ou queimas na fogueira de uns 50mil militares nas praças públicas das mais diferentes cidades. Só assim o país poderá seguir sua história com a consciência de que resolveu os crimes do passado.

  17. Maria Du Casey disse:

    Lamento pela dor que essa comprovacao de morte trouxe a vc e aos entes queridos do Rita e companheiros. Vida retratada em “apenas 3 atos” MM mas 3 atos dignos de serem relembrados como vc o fez: “recordarei com orgulho, para sempre! de um companheiro que teve coragem de enfrentar a ditadura e de lutar pelo que julgava certo, sem abrir mão de seus ideais. Por eles foi torturado, sequestrado e assassinado.”
    Muitos vivem muitos atos mas nao deixam memoir algum. Seu livro da vida continua com suas paginas em branco…

  18. Janete disse:

    Muito, mas muito triste mesmo. Teu amigo pelo menos tem nome, e amigos. E os sem nome, sem nenhuma identificação? Não dá para simplesmente esquecer sse período vergonhoso…
    Texto “encharcado” de sentimento, não tem como não chorar.

  19. ELTON disse:

    Já escrevi e disse dezenas de vezes. Esse tipo de coisa eu não perdôo.
    Não desculparei ninguém que tire de mim um familiar ou amigo.
    E se for intencionalmente, juro que tentarei a justiça com as próprias mãos.
    Lembro que se a justiça alcançar o homicida, possivelmente será segregado por alguns anos.
    Assim que sair da prisão eu vou encontrá-lo na primeira esquina, ou atrás do primeiro
    poste de luz e ele saberá que a vingança lhe alcançou. É olho por olho, dente por dente.
    Assim também faria como familiar desse teu amigo, Mário. O dinheiro das indenizações
    não repara nada. Não traz conforto algum. Pelo contrário, traz mais tristezas.
    Então, como sabemos como localizar os torturadores, eu não hesitaria em alcançá-los
    e fazer meu próprio forno. Morte a esses militares homicidas. Chega de atirar a Deus
    a responsabilidade pelos castigos. Chega de sobrecarregar Deus em tudo o que os
    homens fazem. Deus tem mais o que fazer. Vamos poupá-lo.
    Tudo o que eu escrevi acima é o que penso. Não pretendo influenciar ninguém.

    • Nei disse:

      Agindo assim se sentiria melhor, justificado e “justiçado”?
      Seu sono e restante de seus dias seriam melhores e seriam boas memórias a serem enlevadas a seus filhos e netos como perfeito exemplo ancestral?
      Meu caro, por favor, pense melhor antes de postar sua provável ação, da qual se arrependeria.

    • Luiz Martini disse:

      Parabéns, Elton!!
      Assino embaixo!!
      Também sempre falo que se um merda qualquer me tirar um familiar, eu vou esperar o marginal na porta do Forum, pois da nossa Justiça nada se pode esperar.

      • ELTON disse:

        Na porta do Fórum não dá, Martini.
        Espere ele atrás de uma árvore, poste de luz,
        ou na primeira esquina do presídio. Esses são
        os locais mais adequados.

  20. joão Luz disse:

    Pois é Mário,
    Outro dia “brincando” aqui sobre um texto de Jubiabá disse que tem uma parte da nossa sociedade que deixou secar o seu olho da piedade.
    Essa parte é a mesma que conspirou contra o governo democrático de Getulio e o levou ao suicídio. Que apoiou Jânio Quadros e tentou evitar a posse de Jango. E que fez tudo para que se perpetrasse o golpe militar de 1964. Não satisfeita, conspirou contra o anseio democrático quando ouve o movimento das diretas. E, hoje, é a mesma que se posiciona contra a comissão da verdade.
    Como dizia Vinicius de Morais em seu “cotidiano”, vamos nós por aqui também misturando poesia com cachaça, para por fim, discutir-se política e futebol. E assim vamo-nos vendo cúmplices, divergindo e nos identificando com certas cores clubísticas, e, comungando com certos valores ideológicos e humanitários.
    Enfim, que Gil sintetize esse seu momento!!!
    Que é nosso!!!

  21. Airi disse:

    Mário, hoje choramos junto contigo os três atos da vida do teu amigo João. E dói pensar em quantas mães, pais, filhos e amigos choraram e continuam chorando por seus Josés e Marias que sumiram nos porões da nossa funesta ditadura. Quanta estupidez, quanta crueldade, quanta dor. O Brasil precisa fazer barulho, bater panela, tomar as praças de Maio, de Junho, de Julho, para exigir que os arquivos sejam abertos, que a podridão seja tirada de baixo do tapete onde se esconde há tanto tempo. Como dizem os argentinos: “para que a gente não esqueça, para que nunca mais aconteça”.

  22. edi tavares disse:

    Mário Marcos, vou postar mais um vídeo, “comemoração do golpe”

  23. ricardoteixeiralemos disse:

    1970. estava eu com meus 10 anos vibrando com a seleção, com a chegada do homem à lua e não entendia bem porque tinha que ficar 30 minutos a mais na escola fazendo ordem unida e cantando toda a sorte de hinos. Hoje, obviamente eu percebo. Bem dizem que os canalhas se escondem atrás do patriotismo. Se não podem receber na mesma moeda as atrocidades que cometeram a história à de puni-los para sempre

  24. eduardob disse:

    deve ter sido muito chocante para você, um amigo de infância e tal. para mim, o mais chocante foi o cara “levantar rapidamente a ficha em um domingo”. isso é bem assustador.

  25. Mauro disse:

    Só porque um grupelho não chegava ao poder desde a redemocratização em 46, inventaram a fofoca do temor do comunismo em 64 (os mesmos fofoqueiros de 37, do Plano Cohen). Tomaram o poder, fizeram as leis conforme seus interesses, quebraram o país, cometeram essas barbáries… E querem que esqueçamos isso? Como já escrevi em post anterior, a História é implacável com ditadores e torturadores. E que nós, brasileiros, queremos o nome desses torturadores. E queremos JUSTIÇA! Diferentemente da ditadura, justiça dentro da Lei.

  26. dinah lemos disse:

    deixo meu abraço. dinah lemos

  27. Ellen disse:

    Uma narrativa triste e linda ao mesmo tempo. O carinho do Mario pelo amiguinho daquela época, e o horror daquela outra época que nós da UFRGS muito bem nos lembramos. A kombi cinza do DOPS que aparecia no prédio da Filosofia, ao lado da Reitoria. Dela desciam “pessoas” com cacetetes e batiam em quem estivesse por ali, ou seja, estudantes. Batiam de fazer cair.

  28. Lauri Guerra disse:

    Mário, sei bem o que sentes ao confirmar a morte do Ritinha, com o corolário de barbárie hitlerista. Não conheci o Ritinha mas quando morei em PoA convivi com companheiros que falavam seguidamente dele e outros desaparecidos.
    Várias vezes tive enfrentar este mesmo sentimento de confirmar que amigos e companheiros sucumbiram à barbárie ou, se sobreviveram, as marcas foram tão profundas que os impediu de voltarem a ter uma vida normal (meu fraternal amigo Hilário Gonçalves Pinha foi um monumento ambulante da sobrevivência à tortura – foram 18 cirurgias que lhe deixaram apenas 40 cm de intestino, 13 delas em São Paulo para onde era transferido após sessões de tortura em PoA, para onde retornava para novas sessões de torturas).
    Desde criança convivi com isto. Ainda sem entender direito o que se passava fui-me habituando com esta lógica perversa da ditadura. Eram vizinhos e amigos que eram presos ou desapareciam: presidentes de sindicatos, de associações de bairros, o pediatra que nos atendia, os advogados do sindicato, pessoal dos grêmios estudantis e diretórios acadêmicos, pessoal ligado às pastorais da igreja. Cresci assim, num ambiente de medo e terror político, que não me intimidou. A ditadura militar de 64, alem do sufoco à liberdade a que submeteu toda a sociedade (próprio das ditaduras policialescas), criou uma infra-estrutura de terror para-estatal como guardiã do estado ditatorial (próprio das ditaduras fascistas).
    Covardes, como sempre foram, se escudam atrás da lei da anistia para clamar esquecimento. Anistia é perdão e não esquecimento, e a lei da anistia não se aplica a estes torturadores. A interpretação da lei da anistia de acordo com o direito internacional não anistiou os agentes do estado que cometeram atos de barbárie, como estes relatados pelo ex-delegado Cláudio Guerra (sem parentesco) e muitos outros. A falta de coragem dos presidentes pós-ditadura e a cumplicidade com o crime por parte do STF deixam que a barbárie de agentes do estado passe por “ato político anistiado”, quando não o é. Tribunais internacionais tem condenado a interpretação que é dada à lei da anistia no Brasil e tem requerido ao governo brasileiro a punição dos culpados, assim como fizeram na Argentina. Não queremos revanche, queremos justiça.
    Este relato do ex-delegado não só dá cara aos torturadores, como mostra que o regime fascista foi implantado em conluio de militares fascistas à mando de potência estrangeira com uma parte do empresariado brasileiro e políticos que não conseguiam acessar o poder pela vontade popular.

  29. Luiz Martini disse:

    Prezadíssimo Mário Marcos,
    só agora li teu texto-porretada, brilhante, incisivo, pungente, comovente…
    Mesmo atrasado, não poderia deixar de aparecer para te dar um abraço.
    Um abraço de quem vivenciou a mesma época de arbitrariedades, crimes e desmandos.
    Teu artigo foi tão definitivo que mesmo os defensores da ditadura que frequentam este blog, desta vez não tiveram coragem de mostrar a cara, porque não teriam como desmentir, argumentar ou contestar nada.
    Olha, MM, quando eu crescer queria ter o talento de escrever algo tão completo e absoluto como teu artigo, que não deixa espaço para os caçadores de “comunistas” de plantão.
    Ah, sim, eles estão por aí de plantão, ainda, como o “teu” oficial do domingo…
    Comissão da Verdade neles!!!!!

  30. Fernando Martini disse:

    Caro MM, teu texto me fez refletir bastante.
    Já me manisfestei anteriormente em diversos artigos teus sobre o mesmo tema, e embora eu seja contrário a comissão da verdade, como também já havia dito e exposto antes, não gosto da crueldade que foi praticada e passo a entender melhor os teus posicionamentos.

    Apesar de achar que o debate desse tema, pelo menos para mim, só traz sentimentos ruins, este artigo realmente, além de muito bem escrito, é justo e traz aspectos importantes a ser considerados, além de, principalmente, nos fazer pensar bastante.

    • mariomarcos disse:

      O importante, Martini, como sempre defendi, é o debate. Não importa o que cada um pensa, mas sim a discussão destas ideias. É assim na democracia e é assim que a gente contribui e aprende sempre. Um abraço.

  31. bernalum disse:

    Oi, MM…
    me fizeste lembrar de nosso tempo de penúria (relativa) nos idos de 1969…
    pois é…infelizmente também tivemos nosso Auschwitz tupiniquim… tomara nunca mais se repita !!
    abração

  32. bernalum disse:

    Outra coisa…porque, antes que a gente acesse teu blog tem, este aviso???

    Cuidado.
    Para a segurança e privacidade da sua conta do Facebook, lembre-se de nunca fornecer sua senha a menos que você esteja no site real do Facebook. Além disso, somente baixe software de sites nos quais você confie. Para aprender mais sobre como manter-se seguro na internet, visite a página sobre Segurança do Facebook. Leia também os artigos da Wikipédia sobre programas maliciosos e sites fraudulentos.
    http://migre.me/8XC9E

  33. Marilesia de Aguiar ( Lesia) disse:

    Caro Mário, você me fez recordar meu tempo de FAMECOS/PUC-RS, onde entrei em l969, e sempre havia um “aluno novo” na sala de aula. Filosofia e Jornalismo eram os cursos mais visados pela ditadura, por motivos óbvios. Os agentes não se disfarçavam, então não era muito difícil identificá-los. Só tínhamos liberdade nas aulas práticas de tv e rádio, que eles não assistiam,pois não poderiam participar e temiam ser gravados. Lendo teu brilhante mas doloroso texto, vi passar em minha mente imagens que nunca vou esquecer. Meu pai, filiado ao Partido Comunista, sempre se cuidando. A descoberta de que meu então marido trabalhava no DOPS. Minha separação. O julgamento, no Tribunal Militar, dos meus amigos jornalistas da COOJORNAL, sua posterior prisão na Penitenciária Feminina… tanta coisa… E agora saber da existência dos fornos… é demais. Estou farta! Queria que esta Comissão da Verdade fosse verdadeira… queria que os torturadores fossem identificados mas, lamentavelmente, não tenho confiança nisto. Na verdade, o que eles cometeram é crime imprescritível, então, deveriam ser punidos. E isto jamais vai acontecer. Teremos de continuar lamentando e sofrendo…

  34. Neyde Zys disse:

    Autores dessas atrocidades não contavam com as pessoas que dariam voz às cinzas. Por sorte elas existem.

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